Quem não cola não sai da escola (a farsa da CPI)

Artigo :: Maurício Pássaro

Naquele dia, a classe faria prova de história. A garotada estava aflita, pois o professor tinha fama de rigoroso e exigente; já reprovara muitos alunos em sua vida, sem dó. Nem se importava com as orientações da direção do colégio, de amenizar o rigor, afinal, a história será sempre uma construção com elementos subjetivos, nela entrando o ânimo particular do narrador, onde devem ser consideradas as circunstâncias da época em que se narra.

Mas, não tinha jeito: o professor entregaria a prova naquele dia, e que todos se preparassem. Joãozinho não se preparou. Ou melhor, preparou, sim, papeizinhos com escrita de letras bem miúdas - a cola. O rapaz dizia, aos amigos, que não se tratava de cola, porém, de alguns lembretes para a hora do exame, coisa que estudara em casa, mas, a memória... Cabiam na palma da mão, dentro do estojo, na meia, no cantinho do tênis.

Dizem que Joãozinho pervertera o caráter depois que um tio passou a morar com a família, os pais saíam de casa, e o tio (só tinha o primário) ensinava coisas erradas para o menino. Adorava ligar a TV, no noticiário, e dizer:

- Ó! Tá vendo!

O sobrinho cresceu aprendendo a lição da dureza da realidade. Descobriu muito cedo que o mundo não era um mar de rosas; talvez um mar de ressaca, mas nunca de rosas. O tio dizendo sempre ao rapaz que a verdadeira escola era a vida, que diploma de colégio e faculdade é apenas uma formalidade, objeto de gaveta ou para servir de quadro na parede. O que valia mesmo era a experiência de vida. E no mundo real, manda quem é rico, e enriquece quem é esperto. É esperto quem engana. O mundo é uma ilusão, um engodo. Querer mudar isso é pura pretensão, soberba, chega a ser um pecado. Daí, que enganar, além de ser o certo, ainda era uma virtude, posto que seja uma ação compatível com o resto da normalidade vigente. Joãozinho cresceu ouvindo esse tipo de coisa.

E no dia do trabalhador, a escola fez uma festa comemorativa. Os alunos eram chamados à frente do pátio, perante professores e familiares, para dizerem o que pensavam ser quando crescessem. Foi possível até se fazer uma estatística: 35% desejavam ser médicos; 25%, dentistas. Quinze por cento queriam ser empresários, e o restante estava na dúvida. Na verdade, metade queria ser jogador de futebol, e a outra metade, tocar pagode, porém a escola não permitiu essas opções.

Mas, Joãozinho se destacou, diante de todos, não entrando em estatística nenhuma. Para espanto geral, quando chegou sua vez, respondeu convicto e com um brilho nos olhos:

- Senador. Eu quero ser Senador da República.

E o tio não conseguiu esconder a satisfação, pulava no meio da multidão atônita, gritando "Meu sobrinho! É meu sobrinho!"

mauriciopassaro.blogspot.com.br





Comentários

  1. Se ele aprendeu bem com o tio, não vai demorar virar político nao.

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  2. Aqui no Brasil nós vivemos em dois mundos. O primeiro é aquele em que as pessoas são preparadas e competentes para exercer determinada atividade, como por exemplo é o caso de cirurgiões, de profissionais de empresas de alta tecnologia, de trabalhadores especializados de empresas que exploram petróleo no mar a uma profundidade de 7 mil metros e de muitas outras atividades, onde o mérito daquele que exerce o cargo é essencial. Mas também tem o outro mundo, daqueles que estudaram pouco e com ajuda de um padrinho político conseguiram uma boquinha em um órgão público. São nomeados livremente, sem prestar concurso público, sem precisar conhecer nada sobre a Constituição Federal, nadinha de administração pública, nunca leram o estatuto do servidor da entidade a que pertencem e muito menos sobre a tipificação de crimes do funcionalismo público (credo). O “mérito” desses “servidores públicos” é puxar o saco de um político em época de eleição, carregando a bandeira do partido, distribuindo santinhos, votando nas convenções do partido, fazendo boca de urna e aplaudindo o político no comício.
    Quando se trata de administração pública municipal esse quadro representa 99% dos servidores públicos. Ai eu pergunto: pode o funcionalismo público ser eficiente?

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